Fluidos

Deu um sorvo de uísque e disse-lhe:
— A tua alma tem dedos que harpejam a minha. Por isso, escreve-me um rio.
Sabes de cor o meu poema e reconheces o que os meus olhos te sugerem, mesmo que inacessíveis ao teu sorriso.
Por isso, escreve-me um rio de palavras fluidas, onde possa humedecer a minha existência e desprender-me do pó do meu desassossego. Mas que seja uma corrente de prosa certa, ou, se puderes, de poesia, sem a ilusão que compromete a minha semelhança, a minha liberdade.
Escreve-me um rio de sílabas ritmadas ao coração, para que eu sinta rasgarem-me a carne, pois tudo me sabe a falso.
Um rio constante e imoralmente meigo, entre panos brancos e transpirados, entre a carne de um presente imutável.
Por isso, escreve-me um rio que não pare nunca de desaguar em mim, mesmo perante o tempo estático que se quer na paixão.
Porque sabes, será nesse rio que construirei as margens serenas do amor.
As lágrimas dela ensoparam uma dúzia de toalhetes de papel…

Encontro


Ilustração semeada e colhida no Adobe Firefly

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